Imagine a seguinte situação: você, seja no seu trabalho ou no seu hobby, independente de quais sejam, faz algo incrível, do qual você se orgulha, e opta por compartilhar com o mundo. De repente, aquilo que você se dedicou para criar passa a ser constantemente reproduzido por inúmeras pessoas em suas redes sociais, porém, sem nenhuma menção ao seu nome ou do local onde você trabalha. Não parece uma ideia muito bacana, né? A verdade é que a internet é uma ferramenta incrível que, entre inúmeras utilidades, permite a distribuição em larga escala de qualquer informação ou conteúdo; Seja porque achamos as imagens engraçadas, bonitas ou interessantes, não hesitamos em salvá-las em nossos dispositivos para replicar em nossos próprios perfis sem qualquer preocupação. O problema, porém, é que ao reproduzir esse material de forma inadequada, você pode estar violando a lei de direito autoral e, portanto, cometendo um crime com implicações legais! Mas calma, a gente te explica como funciona.

O que é e como funciona o direito autoral?

O ambiente das redes sociais trouxe de fato inúmeras vantagens para artistas e criadores de conteúdo. Em nenhum momento foi tão fácil produzir e transmitir seu trabalho para o público em larga escala, mas justamente por conta da facilidade de se reproduzir o conteúdo disponível online, o próprio autor pode perder o controle da maneira como sua obra é utilizada e distribuída pela rede.

Basicamente, todo criador é considerado dono de sua própria produção, constituindo a chamada “propriedade intelectual” e, por isso, pegar um texto, música, imagens, vídeo, projetos, arquivos ou até mesmo softwares, e republicá-los sem a devida autorização significa violar os direitos do autor enquanto criador da obra, implicando em crime de plágio previsto em lei. “É preciso ter em mente que todo conteúdo artístico ou intelectual publicado na internet, assim como em mídias impressas e digitais, foi feito por alguém e, portanto, é protegido pela lei de direitos autorais”, explica Amanda Felício, responsável pela administração e curadoria editorial aqui na lab212. O Direito Autoral, então, é a proteção aplicada a diversos tipos de obra e o direito que todo autor de uma propriedade intelectual tem sobre sua criação, como diz o artigo 5° da Constituição Federal, impedindo que a redistribuição, utilização e modificação do trabalho original sejam realizados sem consentimento. “A lei de direito autoral é uma forma de assegurar a integridade, remuneração e valorização dos autores e autoras”, aponta. “Por isso, é sempre importante checar a autoria do que vamos reproduzir, seja para fins comerciais ou não”.

As leis que regulamentam os direitos autorais no Brasil são bastante extensas e abrangem os mais diversos aspectos e detalhes sobre os autores e suas obras diante de qualquer crime de plágio ou pirataria. Além de designar quais criações estão sujeitas às regras e quais podem ser usadas sem a  sua violação, o documento da Lei n° 9.610, que vigora desde 1998 com a premissa de garantir a conservação desses direitos, explica que o autor detém direitos morais e patrimoniais sobre sua própria criação, mesmo que essa não seja registrada em algum órgão público. Os direitos morais são aqueles que reconhecem a autoria de uma obra e, na prática, é o que assegura o nome (ou pseudônimo) do autor nos créditos. “O direito moral é inalienável, intransferível e eterno, refere-se aos direitos de quem criou a obra e lhe garante o crédito, independente da licença”, relata Amanda. “A autoria existe e precisa ser citada, ela está assegurada pelo direito moral, artigo previsto na lei de direitos autorais”. Isso significa que, mesmo em domínio público, qualquer tipo de reprodução das obras deve sim citar o nome do criador, garantindo também o direito de conservação de sua produção diante de possíveis alterações, reivindicação de autoria e suspensão de autorizações já concedidas anteriormente, por exemplo.

Já no âmbito dos direitos patrimoniais, a questão está ligada diretamente com a exploração comercial de uma propriedade intelectual. Diferentemente do direito moral, os direitos patrimoniais podem ser concedidos pelo autor para outras pessoas, empresas ou instituições para que possam editar, reproduzir, traduzir, arquivar, expor e distribuir a obra nos mais variados canais. Essa, normalmente, costuma ser a questão mais complexa do direito autoral, pois implica punições mais severas decorrentes da exploração financeira não autorizada, como o crime de pirataria, por exemplo.

Por isso, em um ambiente como a internet, onde todo tipo de cópia e reprodução é extremamente facilitado, é essencial estar ciente dos possíveis riscos decorrentes dessa violação. “Violar os direitos autorais é crime previsto em lei. A autoria ou titular dos direitos patrimoniais poderá abrir um processo judicial contra a pessoa que se apropriou do material, caso se sinta lesionado”, relata Amanda. De acordo com o art. 184 do Código Penal, “violar direitos de autor e os que lhe são conexos” pode implicar a pena de detenção de 3 meses a 1 ou multa e, em casos mais graves de violação para exploração comercial, a pena pode variar entre 2 a 4 anos de reclusão e multa.

Como evitar problemas?

Mesmo com a existência de uma lei que protege os autores de conteúdo autoral, ainda existem diversas formas de criar e reproduzir conteúdo online sem quebrar nenhuma lei e, pasmem, sem correr o risco de pagar alguma multa. O primeiro passo é, acima de tudo, sempre citar as fontes corretamente e, em nenhuma hipótese, buscar qualquer tipo de lucro ou proveito financeiro sem estar devidamente autorizado pelos criadores originais. Ao pesquisar na fonte de publicação, normalmente existem informações sobre a licença no site ou qualquer outro suporte em que a obra tenha sido publicada. Durante a busca, aproveite para checar se a fonte é segura, pois apenas o titular pode conceder direitos de uso.

Quando as informações que você encontrar sobre a licença do material não forem esclarecidas, o caminho mais seguro é sempre entrar em contato com o autor para solicitar a autorização. Caso não obtenha sucesso, tente reproduzir o mínimo possível, sempre mencionando a autoria e fonte do material, pois a lei garante o uso de “pequenos trechos”, que não devem ser representativos. No caso de imagem onde aparece o rosto de alguém, evite reproduzir sem uma autorização da retratada, pois além do direito autoral, existe o direito de imagem. Mas nunca, em nenhuma hipótese, omita qualquer tipo de autoria. Respeite as limitações da autoria e seja o mais transparente possível. “A pesquisa é a grande ferramenta para uma utilização segura das imagens, pois é a partir dela que colhemos informações que nos permitirá manipular qualquer conteúdo com prudência”, reforça Amanda. “Não propague ou usufrua de imagens sem antes saber a procedência autoral, dessa maneira, também qualificamos o conteúdo no qual elas serão introduzidas”.

Além disso, existem alguns tipos de licenças e autorizações livres, concedidas pelo governo ou diretamente pelos autores originais das produções. O domínio público, por exemplo, é uma condição jurídica que inibe as restrições de uso de uma propriedade intelectual por qualquer um que queira utilizá-la. Para saber se uma obra se enquadra nessa licença basta calcular o ano de falecimento do autor ou autora: com 70 anos de morte, já é permitido o uso livre. Existem também aquelas que são livres apenas para uso não-comercial e/ou educacional, outras que permitem uso comercial e algumas que exigem que o material no qual a obra está reproduzida seja distribuído com a mesma licença. São diversas as possibilidades.

A maioria das licenças conhecidas como “livres” estão licenciadas pelo selo Creative Commons, com licenças atribuídas por selos que demarcam suas limitações, e cada explicação pode ser conferida em seu site. Bancos virtuais como o Pxhere e Freepik, por exemplo, também disponibilizam imagens de uso gratuito para qualquer fim, e o próprio Google fornece ferramentas para buscar imagens e conteúdos com licenças mais abrangentes, mas sempre com a exigência dos créditos. “Toda obra é protegida pela lei de direitos autorais e mesmo nas licenças livres, como Creative Commons, há restrições e é preciso identificá-las para saber se cabe no fim que pretende”, reforça Amanda.

A gente sabe que o processo de criação de qualquer trabalho artístico ou criativo não é simples. Diversas correntes artísticas ou estilos narrativos são baseados na modificação de obras já existentes para transferir um novo significado, como é o caso das sátiras e das paródias, por exemplo, que inclusive são permitidas por lei. Sempre que analisamos a questão de propriedade intelectual, é preciso ter sensibilidade, compreender as nuances de cada caso e, claro, ter o devido bom senso ao lidar com o conteúdo de outra pessoa. Os direitos autorais refletem um choque de interesses privados entre o autor e os interesses coletivos da sociedade em geral, principalmente no que diz respeito ao acesso ao conhecimento.

Ao mesmo tempo que sabemos da existência da lei, existe pouca regulamentação e fiscalização para garantir sua aplicação, principalmente na internet, onde tudo se torna muito mais difícil, e é preciso discutir de maneira mais ampla a questão da privacidade, autoria e direitos digitais para garantir seu funcionamento. E por mais que, aparentemente, esse tipo de regulamentação possa inibir ou dificultar a criação de conteúdo ou a reprodução de obras, o direito autoral, além de proteger o autor, também é uma maneira de estimular a busca pela verdadeira origem do conteúdo, assim como a produção de conteúdo com discernimento e cuidado tão necessários na internet, que às vezes pode parecer uma “terra sem lei”. “A lei de direitos autorais incentiva a produção de conteúdo original e a reprodução de terceiros com responsabilidade. Ela não só beneficia aquele que deseja reproduzir, como qualquer outra pessoa que pretende criar obras artísticas e intelectuais”, finaliza Amanda.